A Prisão e a Fuga são Femininas



Perdi tempo
Tempo demais
Me tomou muito
Partes irrevogáveis
Que ainda não tive condições de advogar em meu próprio favor

O meu condenador ganhou no braço
o direito bárbaro de me acorrentar ao lado do juiz e seu martelo
que também não me absolveriam

Nem mesmo na cela mais úmida,
da torre mais funda, com a menor entrada de sol
eu tive o direito de sofrer apenas minha pena

Comeu o meu prato e o meu corpo,
me dando a honra de escolher em qual ordem seria
E eu o cansava na vã esperança de matá-lo enquanto dormia

Mas no fundo sabia que seus olhos estavam em todos os lugares
Mar ao fundo, escorria desde a Bahia até os sul lagamares

Nas paredes da lembrança, tateava
Reconhecia por número as latências que o tempo deixou,
recôncavos e circunflexos
Ignorando a dor de seus restos
rasgados sob minhas unhas,
eu caminhei os modestos passos das testemunhas

Nas algemas apertadas eu gritava!
Desconhecia por tom as vozes que me tomaram a garganta,
potente e afônica

Meus gestos de ódio e dor são abusados
como o canto de um pássaro do cretáceo
Sem a quilha, me perdi na multidão
de putas e filhas 
- malditas mulheres -
sem vôo, sincronizadas no chão.


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