A casa

Cacuriá, dança típica maranhense. Maíra Soares, Flickr


“Senhora dona da casa
É hora da reverência
Dentro da vossa morada
Concedei vossa licença”

(Tradição do divino)


A casa tem o tempo que o mundo não tem

O que para o mundo custa, para a casa vale

Para repisar o chão em casa, plantas de pé

Para o mundo, hábitos etiquetados e blasé

Emplastificados, esparadrapados e ensacolados -

(em bolsas biodegradáveis, feitas por refugiados)

- Como balas na agulha, mirando o alvo da aceitação.

Já na casa, cabem causos, histórias, riso, espanto e até contradição.


No mundo, não fazer sentido é perigoso, sufocante…

Tudo deve seguir como planejado, nos locais determinados.

Ele recolhe os chinelos dos meninos e lhes dá saltos brilhantes.

(O mundo está calçado em botas de esganar)

À cada vida que a bota tira, um guarda belo nasce como mato

E ao mundo servem, enquanto assim-assados anoitecem.


A casa está deitada com as mãos para trás. 

E por ela passam os passos, sopra o ar em movimento;

A casa é a chinela da alma. A casa é o chicote da casta.

Através dela, odores de fora e de dentro.

Mesmo onde falta grade, a casa é fortaleza sagrada. 

Para uns, tijolo à vista; para outros, jacarandás.


Por onde pisam os pés, daqueles passos que batiam ritmados

em favor de santa bárbara, fazendo do bairro uma Aruanda?

Sob estilhaços de um vendaval, se escondendo do fogo cruzado

- A respiração curta, à pele corta e o peito arfa - 

Fechando os olhos, ainda sente o cheiro do lava pés de lavanda.


De olhos abertos, agora, habita é em Pindorama

a brisa, suave, balança buritis

Sobre seus galhos bailam bairaris.

Ao renascido da asfixia, o furacão é sua cama.


O ilú de Oyá
mostra ao homem sua casa
dança na chuva, quebra o vento
Ó ní laba-lábá*


*Referência: Sara Jane da Silva, na dissertação “O canto de Oyá no Candomblé ketu: um estudo dos aspectos culturais e etnomusicológicos” - Salvador, 2009.

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